quarta-feira, 29 de abril de 2009

Iruña

Ontem chegámos mesmo a Espanha.
E foram oito horas de carro só para isto.
Já não há fronteira e eu nunca gostei dos caramelos.
Gostava mesmo era do quarto andar do Inglês Cortado
e de todos os peluches que recebi.
Chicas tombadas e móteis de beira de estrada.
Já sabemos quanto custa a denúncia de não usar cinturão.
A paisagem entre nós.
Montanhas e campos.
Eu a insistir na banda sonora.
Tu a insistires no silêncio do motor.
Bananas no banco de trás.
Montanhas e campos.
Restaurante-cafetaria e camionistas.
Parece mesmo que estamos no Texas
(não fossem os chouriços dependurados às moscas
e poder fumar-se em todo o lado).

Estamos em terra de padres e seitas
mas hóstia aqui é um palavrão.
E eu nunca pensei subir tão alto como um 13º andar
mas parece que
comer especialidades claustrais
de conventos tirsenses
ajuda à ascensão.

(trabalho na minha obra de redenção
com bolachas de côco e gengibre).

terça-feira, 21 de abril de 2009

Clementine

Haverá sempre um dilúvio quando vejo
The Eternal Sunshine of the Spotless mind?
E esta vontade de pintar o cabelo cor de tangerina?
É verdade que todas as bad girls do cinema têm cabelos assim?
(a Pipi das meias altas também conta?)

Esta vontade
dessa cor
Não é nada positiva.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Technical talk

O meu olhar esgazeado
kind of
coffee-addicted
junkie
denuncia-me:
work in progress.
(Caixinha a caixinha)
Estou a fazer um poster.
Powerpoint
ou
O poder do ponto?
(Caixinha a caixinha)

E há um gato de barriga pelada
que amassa o meu tricot
e brinca com peixes de prata.

"É necessário ter o caos cá dentro para gerar uma estrela!"
Nietzsche

sábado, 18 de abril de 2009

Miopia

Pequenos equívocos
Do ser míope:
Vejo pássaros a voar,
E são sacos de plástico.
Posso ter amizades sinceras,
E não vejo que são paixões.
Eu achava
Era um homem
Mas mais perto
Só um rato.
Vi cavalos a galope
Onde estava afinal
um pónei
Com problemas
no trote.

Urgente para evitar
distorções
É consultar um Oftalmologista.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Question de genre

"Le nez, la queue, c´est exactement la même chose. On dit: «Ne fourrez pas votre nez dans mes affaires.» En fait, ça veut dire: «Ne m´enculez pas».

"J´ai deux points communs avec Mickey Mouse: de grandes oreilles et une longue queue."

"La queue c´est féminin, le con masculin.
Question de genre."

Serge Gainsbourg

Dia X

Hoje é dia de gala, fazes a***.
E eu sei que querias manter isto em segredo.
Respeito a tua vontade
(mais do que temo as tuas ameaças)

Mas é mais forte do que eu.
Celebramos em silêncio?
Deixa-me sussurrar ao teu ouvido:
P*******!

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Le feu rouge (Fogo Vermelho)

Hoje a questão é a seguinte:

- Estás a conduzir, aproximas-te de um cruzamento.
O semáforo fica vermelho.
Sabes que, se quiseres, ainda tens tempo de passar.
O que é que fazes?
- Mmmm... Acelero, arrisco o acidente?
- Não. A resposta certa é sempre a mesma.
Páras.
- Tens razão.
Não quero problemas com a lei.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Passagem de Ceuta

Já atravessámos uma fronteira a pé.
De mochila às costas e mãos vazias.

E eu vi mulheres de vestidos compridos
Que ocultam tudo
Pacotes de arroz, farinha, leite
Detergente da louça.

Vi clandestinos
Escondidos em socalcos
Em encostas de terra e de lixo.

E nunca tive medo
Que me roubassem o passaporte.

Porque eu tinha as mãos vazias.
E uma identidade tatuada mais fundo.
Inscrita dentro de mim.

Sarajevo meu amor

Tu dizes e eu não acredito.
Eu não acredito que neve em Sarajevo.

Para mim, em Sarajevo faz sempre aquele calor tórrido do Verão em que nos (des)encontramos.
Sarajevo e eu, lânguida de doença e suor, a arrastar-me entre limonadas, café com borra e gomas de açúcar.
De repente, dois estranhos.
Fotografada entre turistas, pombas e marcas de balas, Sarajevo foi para mim um não respirar de tantas sepulturas.

Tu dizes e eu não acredito.
Não neva em Sarajevo.

Mas Sarajevo é a tua cidade e não a minha.
Desta vez sou condescendente.

Deixo-te escolher o tempo.

Uma questão de meteorologia

Se eu não fosse uma pessoa assim
tão influenciável
pelas tempestades
as marés
as luas
a fome
a sede
o sono
o calor
o frio
(especialmente o frio)
e tudo o que de resto é fisiológico em mim
ou então terrestre
eu não me ralava

Mas como eu sou
uma pessoa assim
tão influenciável
hoje não posso deixar de estar muito telúrica
com esta chuva maldita.

Em dias assim
queria mesmo muito morar no deserto
(nem que fosse magrebino)
e ter como únicas tempestades
as tempestades de areia.

domingo, 12 de abril de 2009

Beethoven- curso de Inglês- Geor

Hoje ouvi-me aos três anos em fita antiga.
A contar como magoei o dedo na máquina de fazer bolos da Mãe.
- Sabes, Pai, não doeu.
Eu, a pedir:
- Vamos para a paia no tactor apanhar aquilo....
- Sargaço?
- Sim, sagaço!

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Grandes descobertas

Para além das nozes californianas e dos baldes de iogurte de baunilha do Lidl, há os pacotes de muesli.

O melhor dos muesli são as bananas secas.
(o pior são as passas)
Os muesli comem-se com iogurte natural.
Às vezes também sem mais nada.
Ciclicamente, mergulho bem fundo à cata de bananas.
Por causa da serotonina.

Esta noite sou uma revolvedora de cereais.
Em busca das bananas perdidas.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Estação do Oriente

Vamos morar numa cabana num lago na Ásia.
Seremos amantes indiscretos e a rodear-nos teremos montanhas rochosas que vão abafar os teus suspiros e as minhas gargalhadas.
Vamos comer com as mãos ou com os pés e boiar durante uma boa parte do dia sem pensar no grande nada, só seguir as nuvens.
E tu podes dar-me de presente um paradoxo: a ternura de um trompete a soprar música ao meu coração.
E eu vou ter olhos em bico que me farão parecer bastante enigmática. E poderei dar-te os nossos bebés em gritos silenciosos e eles serão gordos e rosados, cheios de saúde e de expectativas.
Vamos viver violentamente um amor calmo.

Um dia, se me chateares muito, empurro-te à traição e vais conversar com os peixinhos.

Este é o meu primeiro post sobre viagens. Talvez se sigam outros.

Parabéns

Fizeste anos e eu lembrei-me de nós.

Quando foste uma fada, vestida de branco e de varinha em riste e eu de punk, a levantar-te a saia.
Quando achava que ser punk era vestir-me de gangas com os óculos de sol da minha Mãe.
E lábios às cores.
Vermelho e preto.

Quanto tempo já passou desde que te obriguei a ir correr no parque de raquete em punho?
Atrás de rapazes.

Lembrei-me de nós.

Quando tu só sabias assobiar ao contrário.
Para dentro.

(Hoje assobiamos no escuro)

Eu a queixar-me de não gostares de gatos.
E tu, anos depois, a co-habitar.

- Mas se elas fugirem, nem penses que pego nelas.

Do teu livro preferido:
- Ariana, rapariga russa.


O teu passatempo inconfessável aos 8 anos:
-Passar a ferro.

E que já gostaste de novelas venezuelas dobradas.
- Estrelinha, a pobre coitada que cegou.

Lembrei-me de nós agora.

Eu em cinzentos.
Desintegrações cíclicas mensais.
Tu mais preto e branco.

- Massa com atum.
Na cozinha.

Dos ajustes da amizade:
- Eu aprendo a emprestar livros se tu aprenderes a emprestar filmes.

O teu risinho mordaz.
-Precisas de um harém?

O nosso riso junto quando me declarei:
- Em fase pró-homem.

Lembrei-me de ti adolescente enlevada.
Em Paris, à procura da rua onde o Jean-Paul Belmondo foi assassinado com um tiro no fundo das costas.
À queima-roupa.

- Aquela conversa de cama é maravilhosa.

Teremos tempo para chegar aos sete amantes?
Um dia vamos ter uma conversa igual.

Entretanto, tens sempre os meus chás de tudo.
Trazes-me supremas de chocolate?

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Aviso à navegação

Hoje pensei na nossa conversa. Peri-patética.

-Não me faças promessas dessas.
Arranjas sarilhos na meia-idade.

Se quiseres, casamo-nos.

- Olha o que te digo.
Não te deixes enganar por ameaças de candura.

Ramos de flores aos Domingos.

- Abre o olho.
Não sou nenhum pássaro caído do ninho.

Flores silvestres?

- Desengana-te.
Eu tropeço mas não caio.

Piqueniques.

- Sou fora-da-lei.
Quase ruim.

Com sorvetes?

-Faço parte de um bando.
Um bando à parte.

330

"- Ser progressista é ser verdadeiramente um homem. E ser um homem verdadeiro é ser forte, comer bem, digerir bem, fornicar bem.
- De quem é essa opinião?
- Minha, naturalmente.
- Julguei que fosse a de um cavalo."

Vergílio Ferreira, Pensar.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Fruta da época

A situação é esta:
Decidi mudar.

Troquei a noisette por nougatine.
Bastam 30 minutos.
Tom sobre tom.

É mesmo verdade o que dizem das mulheres e os cabelos?

Tom sobre tom.

Gostes ou não.
É a fruta da época.
E a época é de Sol.

História triste sem final

Tenho dois irmãos e são a minha família.

O meu irmão mais velho é o Vasco.
Gosta muito de leituras.
Quando me vem ver, diz-me:
-Não digas a ninguém que estás doente. Põe-te bem, afasta a doença.
Ele diz-me isto e tem lágrimas nos olhos.

Sabe, as pessoas às vezes não sabem falar com os doentes.
As minhas amigas são velhas como eu, mas estão melhores do que eu.
Dizem:
- Fulano também tinha uma úlcera assim. Infectou de fora para dentro e teve que amputar a perna.

E eu não sou de cismas mas fiquei a pensar nisto e não consegui dormir.

O nosso irmão mais novo era piloto e foi o primeiro a partir.
Íamos visitá-lo e o Vasco dizia:
-Quando saires daqui, levo-te a um stand e escolhes o carro que quiseres. Eu ofereço-te.

Ele estava mesmo magrinho, mas o Vasco é assim. Não conseguia aceitar que ele nos ía deixar.

Já sofri muito. Casei-me e divorciei-me duas vezes com o mesmo homem.
Ele era como uma borboleta, de flor em flor.
Uma das amantes escrevia-me bilhetes. Sabia que era eu que lhe tratava da roupa.
Marcas de baton nas camisas, nas cuecas. E eu lavava.
Deixava-me bilhetes no bolso do casaco.
-Quem é a puta afinal? Eu passeio com ele, tu lavas e engomas.

Eu guardava os bilhetes. Achava que me podiam servir para alguma coisa. Um dia juntei-os e queimei-os todos.

Quando ele me deixou, casou-se com ela.

Hoje somos as duas viúvas.
E eu já fui tão infeliz. Só quero não ter dores.